se voavam, invertebrados. ossos pesam. preocuparam-se todos os adultos, houve correria, e alguém afastou martina do ponto onde a grama misturava-se aos restos do passarinho morto pelos cães de guarda. achou bonito o vermelho do sangue colorindo as penas, nenhum detalhe a impressionara, mas foi a visão daquilo que mais pareciam gravetos brancos que fez martina chorar. não chocada, mas impactada pela descoberta. tinham ossos, as aves. sentiam dor. quebravam. a inconsciência de criança mantém martina alheia às especulações - nada de detalhes sobre a morte. mas porque são precoces aos seis anos as meninas, preocupou-se martina com os filhotes, que agora piavam sem pausa de algum lugar do telhado. quem vai alimentá-los? morrerão de fome? se minha mãe é morta, ninguém me cobre de madrugada. talvez congelem.
acomodada na cama, martina sonha com um ninho feito de folhas secas e crina de cavalo. conta cinco bicos abertos, e o que se escuta é música. quando coloca as mãos sobre as avezinhas, percebe seus dedos esquentarem até sentir calor. são os ossos, martina, diz um dos filhotes de bico aberto. com eles nos aquecemos, por eles sobrevivemos. nós, passarinhos, somos mágicos.