Tuesday, May 24, 2011

um breve adeus

nada gastem com o funeral mais impopular da história. não paguem a conta das bebidas, não há convidado sedento. esqueçam os salgados para aplacar a fome dos que não virão. guardem as cadeiras, apaguem as velas, economizem nos ornamentos - as flores murchariam por não saberem a quem perfumar. as orações podem seguir seu rumo sem paradas. lamentos não serão ouvidos, histórias saudosas não se contarão. que sosseguem o defunto de quem não se rirão os defeitos e tropeços. sem caixão, sem lençol, o corpo seguirá invisível à indiferença de quem nunca o celebrou. cancelem o velório, cancelem o enterro. o morto, na verdade, não há.

Tuesday, May 03, 2011

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diálogo besta de meio de festa, o que você faz? eu podo plantas e eu varro escadas, um interesse estúpido porque o que importa na verdade não tem relação com o estar e sim com o ser, esse olhar fundo perseguindo minhas coxas pela casa, até que se sinta um convite e a correspondência. eu já era sua antes de você chegar, ela murmura quase sufocando, e respira o ar do outro vindo de dentro da boca quente e da língua doce em camadas. enquanto aperta o peito esquerdo dela na mão gelada, sente que a biologia o enganou por anos a fio e que o coração na verdade bate dentro do estômago espremido abaixo do esterno, um músculo que engole digere e adora. pulsa oitenta e três vezes antes de apertá-lo no meio das pernas entregue e louca jurando amor eterno.