Tuesday, June 29, 2010
fuga
a menina acordou com o barulho do pára-sol se fechando. bernardo já não sentia mais os olhos ardendo do laranja do fim da tarde, e com descuido deixou escapar o barulho seco que assustou-a no banco de trás. desculpe, volta a dormir, mas não havia mais cansaço suficiente depois de quase seis horas ressonando, o carro costurando enjoativo pela serra do mar. trouxemos biscoitos, lembra? come um, assim se distrai, e teresa mastigou duas, três rosquinhas de polvilho, até decidir tocar no assunto que realmente importava. para onde vamos? para a casa da floresta, por que fugimos? não fugimos, nos apressamos. é prudente abastecer, pensou bernardo, a noite cai e nos vilarejos quase não existem postos abertos. vamos jantar, veste o casaco, e mais um punhado de ordens até teresa se ajeitar na cadeira da lanchonete, a essa hora cheia de caminhoneiros e algumas famílias. vou querer um virado, e, para ela, uma sopa quente. bico de desaprovação. jantaram em silêncio, largou metade do prato? você me mandou comer biscoitos e não me resta fome para tantos legumes. quando voltaremos? não sei, e minha escola? não importa, cadê minha mãe? não pergunte. já de volta ao carro, entediada e de barriga cheia, teresa estica as pernas entre os bancos do motorista e do carona. são pequenos os cambitos, vestidos numa meia-calça grossa cor-de-rosa. não te preocupa, teresa, diz bernardo, apertando os dedinhos dos pés dentro do sapato de verniz, nada de mal te acontece estando ao meu lado. acreditas no teu pai? e pelo retrovisor vê a menina soprar um beijo de sim.
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